
10 de dezembro de 2025
Avaliação da eficiência dos fundos de combate à pobreza nos estados brasileiros
Autor: Adriel Matheus Vieira — Orientador: Wagner Wilson Bortoletto
Resumo elaborado pela ferramenta ResumeAI, solução de inteligência artificial desenvolvida pelo Instituto Pecege voltada à síntese e redação.
Este estudo avalia a eficiência da aplicação dos recursos dos Fundos Estaduais de Combate à Pobreza (FECOP), de 2019 a 2023, por meio da Análise Envoltória de Dados (DEA) e da Regressão Tobit. Os objetivos específicos são mensurar a eficiência relativa dos estados brasileiros com FECOP, identificar os de maior e menor desempenho, e investigar os fatores socioeconômicos, demográficos e estruturais relacionados aos níveis de eficiência. A análise busca preencher uma lacuna na literatura sobre a efetividade de tais fundos, fornecendo evidências empíricas para aprimorar políticas públicas. A premissa é que a existência de um fundo não garante a conversão eficaz de recursos em melhorias sociais, sendo crucial analisar a gestão e o contexto de cada estado.
A pobreza é uma privação multidimensional de bem-estar que abrange a falta de acesso à alimentação, habitação, educação e saúde (IPECE, 2004). Frequentemente mensurada por linhas de renda (Rocha, 2003), organismos como o Banco Mundial estabelecem critérios como a renda diária inferior a US$ 1,90 para a extrema pobreza, enquanto no Brasil as referências comuns são a renda domiciliar per capita inferior a meio ou um quarto do salário-mínimo (Banco Mundial, 2001). O enfrentamento da pobreza é um pilar do ordenamento jurídico brasileiro, estabelecido na Constituição de 1988, que visa à dignidade da pessoa humana e à redução das desigualdades sociais e regionais (Brasil, 1988).
Nesse contexto, o artigo 82 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT) determinou a criação dos Fundos de Combate à Pobreza. Esses fundos são instrumentos para mitigar a pobreza e a desigualdade social (Paraná, 2015). A gestão descentralizada dos FECOP permite que cada estado adapte a aplicação dos recursos às suas demandas regionais. Uma das principais fontes de receita é um adicional de dois pontos percentuais na alíquota do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) sobre produtos e serviços supérfluos (Santos, 2024).
Apesar da relevância dos FECOP, há carência de estudos que avaliem sistematicamente a eficiência de sua aplicação. A análise da conversão dos recursos em resultados sociais concretos, como a redução da taxa de pobreza, a diminuição do índice de Gini e a ampliação do emprego, é essencial para otimizar a alocação desses recursos. A ausência de avaliações robustas dificulta a identificação de boas práticas e a correção de políticas. Este estudo justifica-se pela necessidade de fornecer evidências empíricas para orientar gestores públicos. Ao mensurar a eficiência dos estados e investigar seus determinantes, a pesquisa oferece um diagnóstico detalhado. A combinação da Análise Envoltória de Dados (DEA) com a Regressão Tobit permite identificar os estados de referência (benchmarks) e compreender quais características estruturais, demográficas e socioeconômicas influenciam a transformação de recursos financeiros em bem-estar social, contribuindo para uma gestão pública baseada em evidências.
A pesquisa empregou uma abordagem quantitativa em duas etapas. A primeira aplicou a Análise Envoltória de Dados (DEA), um método não paramétrico para mensurar a eficiência relativa de Unidades Tomadoras de Decisão (DMUs) (Charnes et al., 1978). No estudo, as DMUs são os estados brasileiros com FECOP. A técnica avalia se um estado opera de forma eficiente em comparação com os demais, considerando os recursos utilizados e os resultados sociais obtidos (Cook et al., 2014; Kocourek, 2007). Foi selecionado o modelo DEA-BCC, que assume Retornos Variáveis de Escala (VRS), adequado para comparar estados com diferentes capacidades. A orientação a outputs foi adotada para focar na maximização dos resultados sociais.
A segunda etapa utilizou a Regressão Tobit para investigar as variáveis externas que podem explicar os escores de eficiência calculados pela DEA. O modelo Tobit é adequado porque os escores de eficiência são uma variável censurada no intervalo [0,1], o que torna regressões lineares convencionais inadequadas (Alhusseini, 2016). Optou-se por uma implementação bayesiana, utilizando o algoritmo MCMC (No-U-Turn Sampler – NUTS). A inferência bayesiana oferece vantagens como a geração de distribuições a posteriori completas para os parâmetros, permitindo uma interpretação probabilística direta dos efeitos, além de maior robustez em amostras pequenas e com forte censura (Waisman, 2024; Costa et al., 2025). A Regressão Tobit é, portanto, apropriada para compreender como características institucionais e socioeconômicas influenciam a eficiência (Gagliardi et al., 2023).
Os dados cobrem o período de 2019 a 2023 e foram coletados de fontes como IPEA, IBGE e portais de transparência dos estados. As DMUs foram os estados com FECOP instituído, excluindo-se Acre, Amapá, Amazonas, Pará, Roraima e Santa Catarina por não apresentarem arrecadação específica. No modelo DEA, o input foi a arrecadação per capita do FECOP. Os outputs foram três indicadores socioeconômicos: a taxa de pobreza, a taxa de desemprego e o índice de Gini, todos do IBGE, consolidados na literatura como medidas de privação, inserção no mercado de trabalho e desigualdade (Rocha, 2003; Hoffmann, 1999; ILO, 2023).
Para a Regressão Tobit, foram selecionadas variáveis que representam dimensões estruturais, demográficas e socioeconômicas. Indicadores de infraestrutura, como proporção de domicílios com coleta de lixo e acesso a esgoto, foram incluídos por sua relação com as condições de vida (Dantas et al., 2017). O capital humano foi representado pela taxa de analfabetismo e pela proporção de indivíduos com ensino superior (Meleddu e Paulina, 2018). O Índice de Vulnerabilidade Social (IVS) do IPEA foi utilizado para capturar dimensões não monetárias da exclusão (IPEA, 2015). Variáveis como densidade populacional, PIB per capita e proporção de idosos também foram consideradas (Wang, 2018; Moura et al., 2017). O tratamento dos dados incluiu a transformação dos outputs da DEA para que valores maiores representassem melhores resultados (Cook e Zhu, 2014): taxa de pobreza convertida em taxa de prosperidade, taxa de desemprego em taxa de emprego, e índice de Gini em índice de equidade. Ajustes como interpolação linear foram realizados para padronizar a série temporal. As análises foram conduzidas em Python, utilizando bibliotecas como pandas, pyDEA e PyMC.
Os resultados da DEA revelaram que uma parcela significativa dos estados não alcançou a eficiência plena na conversão dos recursos do FECOP. Os escores de eficiência mostraram que apenas as unidades com escore igual a 1 foram eficientes. Destacam-se Minas Gerais (em 2022 e 2023) e Rondônia (em 2020, 2022 e 2023), que demonstraram capacidade consistente de transformar recursos em avanços nas taxas de prosperidade, emprego e equidade, funcionando como benchmarks. A análise indicou que a eficiência não é uniformemente distribuída, com diferentes estados alcançando a fronteira de eficiência em anos distintos.
A visualização espacial da eficiência média evidenciou padrões regionais. Estados como Rondônia, Mato Grosso e Rio de Janeiro figuraram nas faixas mais altas de eficiência, enquanto Bahia e Rio Grande do Sul se concentraram nas faixas de menor desempenho. Essa distribuição geográfica reforça que as disparidades regionais e as diferentes capacidades institucionais desempenham um papel crucial na efetividade das políticas. A heterogeneidade dos resultados sugere a necessidade de estratégias adaptadas aos contextos locais, que considerem as particularidades de cada região.
A análise de folgas (slacks) mostrou que a ineficiência da maioria dos estados não se devia a um excesso de recursos (input), mas ha um déficit de resultados (outputs). O problema reside na dificuldade de transformar o recurso em melhorias sociais. O principal gargalo foi o indicador de Prosperidade, derivado da taxa de pobreza, cujas folgas foram substancialmente maiores em comparação com os indicadores de Equidade e Emprego. Este achado corrobora estudos do IPEA (2021) e do IBGE (2023) que apontam a pobreza como um fenômeno estrutural que exige ações integradas e de longo alcance.
A identificação dos estados que serviram como benchmarks forneceu insights valiosos. O Rio de Janeiro (2023) foi citado como referência 62 vezes, seguido por Minas Gerais (2023) com 60 citações e Rondônia (2022) com 40. Essa alta frequência indica que, nos respectivos anos, esses estados conseguiram um alinhamento exemplar entre arrecadação e resultados sociais. As estratégias adotadas por eles podem servir como roteiro para outras unidades. Os resultados da DEA apontam que a qualidade da alocação e execução das políticas é mais determinante para o sucesso do FECOP do que o volume de arrecadação.
A investigação dos fatores de eficiência, via Regressão Tobit, partiu da matriz de correlação. Observou-se correlação positiva e moderada da eficiência com o PIB per capita (0,48), o rendimento domiciliar médio (0,47) e o percentual da população com ensino superior (0,49). Em contrapartida, a eficiência apresentou correlação negativa forte com a taxa de analfabetismo (-0,54) e com o Índice de Vulnerabilidade Social (-0,54). A matriz também revelou alta colinearidade entre algumas variáveis independentes, como PIB per capita e rendimento domiciliar (0,93), sinalizando a necessidade de tratamento para evitar multicolinearidade.
Para garantir a robustez do modelo, foi realizada uma análise de multicolinearidade pelo Fator de Inflação da Variância (VIF). A análise confirmou que as variáveis de renda domiciliar (VIF=18,46), proporção com ensino superior (VIF=11,89) e PIB per capita (VIF=11,88) apresentavam forte colinearidade. Após testes, as variáveis de renda domiciliar e proporção com ensino superior foram removidas. No modelo final, todas as variáveis apresentaram valores de VIF abaixo do limite crítico de 10, assegurando a estabilidade dos coeficientes estimados.
Os resultados da Regressão Tobit Bayesiana revelaram que quatro variáveis foram estatisticamente significativas. A densidade demográfica apresentou um coeficiente positivo, indicando que estados mais densamente povoados tendem a ser mais eficientes, possivelmente devido a economias de escala. Por outro lado, três variáveis apresentaram associação negativa com a eficiência: a proporção de pessoas em situação de pobreza, o Índice de Vulnerabilidade Social e a cobertura de coleta de lixo. A relação negativa com a pobreza e a vulnerabilidade sugere que, quanto maior a magnitude dos desafios sociais, mais difícil se torna para o estado gerar impacto com os recursos do FECOP. A associação negativa com a cobertura de coleta de lixo reforça que carências estruturais comprometem a capacidade do estado de promover o bem-estar social.
O presente estudo avaliou a eficiência dos Fundos Estaduais de Combate à Pobreza no Brasil entre 2019 e 2023, utilizando DEA e Regressão Tobit Bayesiana. Os resultados evidenciaram que a eficiência na conversão de recursos em melhorias sociais é heterogênea entre os estados, com alguns se destacando como benchmarks. Ficou claro que a eficiência não depende apenas do montante arrecadado, mas da capacidade de gestão de cada estado. A análise dos gargalos mostrou que a redução da pobreza continua sendo o desafio mais resistente, exigindo estratégias mais complexas. A investigação dos determinantes da eficiência demonstrou que fatores estruturais, demográficos e socioeconômicos exercem influência significativa. A densidade demográfica mostrou-se positivamente associada à eficiência, enquanto a alta proporção de pobreza, a vulnerabilidade social e as deficiências em serviços básicos atuam como barreiras. A eficácia do FECOP está condicionada pelo contexto no qual opera. O trabalho contribui ao oferecer evidências de que a efetividade do fundo depende de uma gestão estratégica, que integre a alocação de recursos com investimentos em infraestrutura e capital humano. Sugere-se que futuros estudos ampliem o escopo da análise, incluindo outras variáveis e avaliando os estados que não possuem o fundo. Conclui-se que o objetivo foi atingido: demonstrou-se que a eficiência dos FECOP é significativamente influenciada por fatores contextuais e que a mera disponibilidade de recursos financeiros não assegura, isoladamente, avanços sociais expressivos.
Referências:
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Resumo executivo oriundo de Trabalho de Conclusão de Curso de Especialização em Data Science e Analytics do MBA USP/Esalq
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