Limites jurídicos na elaboração de um planejamento tributário empresarial
3 de fevereiro de 2023
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DOI: 10.22167/2675-6528-20230006
E&S 2023,4: e20230006
Marcela Robles Queiroz e Leonardo Cosme Formaio
A análise sobre os limites jurídicos incidentes na elaboração de um planejamento tributário tem como objetivo apresentar a sua relevante importância para as empresas, de tal modo que um planejamento tributário realizado de forma assertiva e eficaz, consiste na redução da alta carga tributária existente no Brasil[1]. O que o planejamento tributário faz?
O planejamento tributário, além de permitir a redução do montante dos impostos com o adiamento do pagamento sem a ocorrência de multas, penalidades e incidência do fato gerador, é a forma legal de diminuir a carga tributária. Existem dois fatores que determinam a importância do planejamento tributário nas empresas, sendo eles, o elevado ônus fiscal e a complexidade da legislação tributária existente[2], [3]. É importante observar que, tem-se como princípios constitucionais que abrigam as elaborações dos planejamentos tributários empresariais a Elisão Fiscal e a Evasão Fiscal.
É preciso considerar a elisão fiscal como a forma eficaz, sendo a forma lícita que fica à disposição dos contribuintes que almejam uma carga tributária com menor onerosidade e que apresenta os limites legais, sendo uma prática aceita pelo ordenamento jurídico, desta forma contrapondo as práticas ilícitas e ilegítimas. Em contraposição, tem-se a evasão fiscal, que consiste na realização de atos ilícitos, tais como fraude, sonegação e simulação, para evitar o pagamento dos tributos[4].
Ademais, a importância do planejamento tributário consiste na diminuição da carga tributária do negócio empresarial, sendo realizada de forma lícita, com os limites jurídicos incidentes visando a análise do real motivo almejado pelo contribuinte, ou seja, se o planejamento tem como finalidade a economia ou a dissimulação do tributo.
Nesse contexto, a problemática consiste na elaboração de um planejamento tributário assertivo e eficaz, gerando a redução dos tributos, bem como suas limitações jurídicas incidentes e a amplitude do parágrafo único do artigo 116 do Código tributário Nacional[5].
A pesquisa realizada e o caso prático analisado possibilitaram identificar quais são os limites jurídicos existentes em um planejamento tributário, seus princípios e qual a sua fundamental importância e aplicabilidade, almejando, dessa forma, a assertividade na redução da carga tributária com embasamentos previstos nas legislações.
Atualmente no Brasil tem-se um complexo sistema tributário e legislações com regras e normas estabelecidas que sobrecarregam o entendimento sobre qual o melhor regime de tributação e quais impostos incidem sobre o negócio empresarial. Para auxiliar na tributação das empresas com a redução das altas cargas tributárias, surgiu o planejamento tributário, que visa a otimização da redução da carga tributária de forma lícita e melhor entendimento sobre as legislações vigentes[6], [7].
O planejamento tributário empresarial tem como objetivo avaliar o negócio, aplicando as legislações tributárias adequadas e, consequentemente, reduzindo os recolhimentos exorbitantes e evitando os prejuízos fiscais, a bi-tributação e os altos pagamentos de impostos desnecessários ao negócio.
Para a elaboração de um planejamento tributário tem-se como princípios relevantes a Elisão Fiscal e a Evasão Fiscal. No que diz respeito a Elisão Fiscal, tem-se algo lícito que evita ou minora a incidência dos tributos, já no caso da Evasão Fiscal, tem-se algo ilícito, que gera o dolo, a fraude e a prática de negócios ilícitos[6].
A fim de garantir um planejamento tributário eficaz e assertivo, respalda-se na Elisão Fiscal, com a finalidade de evitar penalidades legais, sendo um conceito mais amplo e abrangente de realizar o planejamento dentro da legalidade.
É importante observar que os limites jurídicos visam analisar o real motivo na redução da carga tributária almejado pelo contribuinte, verificando se tal forma caracteriza a economia dos tributos no negócio de forma real e lícita. Esse conceito se alinha ao dever de pagar e não se opõe à Elisão Fiscal, devendo se atentar para a não ocorrência da dissimulação, que visa na redução da carga tributária utilizando-se de forma atípica para encobrir um negócio oculto.
No que diz respeito aos limites jurídicos (artigo 116 do Código Tributário Nacional – CTN[5]) é importante lembrar que muitos doutrinadores têm o entendimento de ser a norma Antielisão, direcionada a oposição da dissimulação do real fato gerador do tributo, que oculta a atividade real para se beneficiar da redução da carga tributária. A norma antielisão não visa o combate da Elisão Fiscal, mais sim o da Evasão Fiscal[2], [3], de tal modo, o aspecto jurídico desenvolvido no artigo 116 do Código Tributário Nacional[5] é uma imposição jurídica, que determina como limite no planejamento tributário a forma ilícita de ocultar atividade para se beneficiar da redução da carga tributária. É de fundamental importância o contribuinte se beneficiar da redução da carga tributária de forma lícita, com a utilização de um planejamento tributário assertivo que visa analisar o real negócio empresarial e o melhor regime de tributação, onde será possível a diminuição da carga tributária e, consequentemente, a economia no recolhimento dos impostos.
As manifestações doutrinárias acerca do artigo 116 CTN[5] definem o entendimento como a norma antielisão, que objetiva a forma lícita da realização do planejamento tributário. É preciso considerar que o planejamento tributário possui bases legais que visam a redução tributária, pois o contribuinte tem o direito de melhorar a estrutura do seu negócio, procurando, assim, a redução dos custos, inclusive dos impostos desnecessários a natureza da operação empresarial, contribuindo para uma melhor regularidade fiscal e financeira da empresa.
A aplicabilidade do planejamento tributário nas empresas, e a análise dos limites jurídicos incidentes, precisam ser realizadas dentro das legalidades estabelecidas juridicamente, de tal forma que levem a redução da carga tributária de forma lícita, evitando as penalidades, a falta do recolhimento dos impostos e os ônus fiscais nas empresas.
A análise realizada consistiu no serviço de instalação de aparelhos de ar-condicionado com empreitada global parcial e total, sendo necessário a realização de projetos de engenharia com o acompanhamento de engenheiros e equipes especializadas nos locais onde os serviços são realizados, bem como a aplicação de materiais essenciais que são destinados a execução dos serviços e a instalação dos equipamentos.
Para a realização do serviço de instalação de ar-condicionado, contidos dentro dos serviços de construção civil, é indispensável ter engenheiros envolvidos, conforme previsto no artigo 7º da seção IV da Lei 5194/1966[8], que regula o exercício da profissão do engenheiro, dentre as atividades e atribuições do engenheiro, temos alguns exemplos: o planejamento, o projeto, a fiscalização e a execução da obra; serviços estes que estão elencados dentro da construção civil.
Conforme previsto no artigo 156 da Constituição Federal de 1988[9], [10], o Imposto Sobre Serviço de Qualquer Natureza (ISSQN) é um tributo de competência da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e, no artigo 146, inciso III da mesma Constituição, estabelece como normas gerais que cada município precisa regular o imposto, respeitando sempre os ditames da Lei Complementar 116/2003[5] que regulamenta o imposto sobre serviço em âmbito nacional.
Na Lei Complementar 116/2003[5] tem-se alguns artigos importantes, no artigo 3º, está a relação dos serviços que caracterizam a incidência do ISS, para o serviço 7.02 relacionado a construção civil, o mesmo encontra-se no inciso III do mesmo artigo supracitado, no artigo 7º em seu parágrafo segundo, está estabelecido que a base de cálculo dos serviços realizados de construção civil que estão relacionados a engenharia será o preço do serviço, excluindo-se os materiais aplicados na execução dos serviços.
Ocorre que, na Lei supracitada, não tem a caracterização de material aplicado ou percentual permitido para dedução, somente que os materiais não se incluem na base de cálculo do ISS, gerando diversos impasses relacionados a real interpretação da Legislação por parte das fiscalizações e Leis Municipais.
Convém lembrar que os serviços passiveis da retenção do ISS, considerados no artigo 3º da Lei Complementar 116/2003[5], são devidos no local onde o serviço for prestado, sendo de total importância observar além da Lei supracitada, as Leis Municipais onde o serviço foi prestado, pois este será o local do devido recolhimento do imposto.
Existindo algumas imposições por parte das fiscalizações municipais, no que se refere a material aplicado, onde muitos entendem como material incorporado a obra aquele que não poderá ser retirado do local, como por exemplo, o cimento, esse material para ser retirado precisa haver uma nova obra, onde será totalmente removido. Como outro exemplo, pode ser citado o parafuso, esse se dá o entendimento que poderá ser retirado, não sendo incorporado a obra, tal fato se opõe a Lei Complementar 116/2003[5], no que se refere a materiais aplicados na prestação dos serviços que não integram a base de cálculo do imposto. Em outros casos estão municípios que não permitem a dedução do material aplicado, obrigando a retenção do ISS sobre o valor total do serviço, incluindo na base de cálculo o material aplicado, ocasionando, assim, a bi-tributação do imposto, dessa forma gerando distintos entendimentos dos municípios quanto a legislação regulamentadora do ISS, sendo esta, a Lei Complementar 116/2003[5].
No serviço de instalação dos aparelhos de ar-condicionado, tais aparelhos e materiais utilizados já foram tributados pelo ICMS, pois na prática o ICMS tem o seu valor incluso no preço do produto no momento de sua comercialização ou do serviço prestado.
Convém lembrar que os materiais utilizados na construção civil, a partir de 2009, passaram para a sistemática da substituição tributária do ICMS em Estados membros, dessa forma pode-se analisar que o ICMS é recolhido pela indústria em toda a circulação da mercadoria até chegar ao consumidor final, motivo esse que não pode ser tributado pelo ISS, sendo obrigatória a tributação do ISS somente no serviço realizado, sendo o material ou equipamento deduzido da base de cálculo do ISS[11], conforme previsto na Lei Complementar 116/2003[5], evitando dessa forma a bi-tributação do imposto.
De tal modo, determinar a inclusão dos materiais na base de cálculo do ISS leva ao entendimento de tributar duas vezes, impostos diferentes, pelo mesmo fato gerador, ou seja, já ocorreu a tributação do ICMS na circulação da mercadoria até chegar ao consumidor final, que em alguns Estados está tributada pela substituição tributária, se houver a inclusão dos materiais na base de cálculo do ISS, haverá assim a tributação também por esse último. Fica evidente que os materiais adquiridos de terceiros e aplicados na obra não podem integrar a base de cálculo do ISS, devendo, dessa forma, serem deduzidos da base de cálculo do imposto.
É preciso considerar que alguns municípios seguem à risca a Lei Complementar 116/2003[5], permitindo a dedução do material da base de cálculo do ISS sem limitar o percentual da dedução. Outros municípios criam regras e limites relacionados ao percentual permitido para dedução e, há outros que não permitem a dedução, ficando assim em desacordo com a Lei regulamentadora do imposto.
Cabe salientar, que a presente pesquisa objetivou a apresentação da importância de um eficaz e assertivo planejamento tributário, realizado através da análise do negócio empresarial e a adequação do regime tributário na empresa, evitando assim o pagamento exorbitante dos impostos. Contudo, com a utilização da Elisão Fiscal podemos ter um planejamento tributário lícito e assim ter a economia na carga tributária[12]. O parágrafo único do artigo 116 do código tributário nacional[5] e as manifestações doutrinarias estão bem articuladas e definidas, concluindo-se que o seu objetivo é evitar a dissimulação tributária, ocorridas de formas ilícitas. Nesse contexto, convém lembrar que o objetivo foi demonstrar as oposições relacionadas a Lei Complementar 116/2003[5] que regulamenta o imposto sobre serviço de qualquer natureza, que impactam significativamente em alguns aspectos relacionados a carga tributária, gerando a bi-tributação na incidência do imposto sobre serviço de qualquer natureza (ISS) e, consequentemente, gerando ônus para os negócios. Como resultado foi constatado que é de fundamental importância a revisão nas legislações municipais ou a inclusão de um regulamento na Lei Complementar 116/2003[5], com a definição dos materiais que podem ser deduzidos da base de cálculo e seus percentuais. Com a elaboração de um regulamento único, será possível evitar distintos entendimentos pelos fiscos municipais relacionados ao assunto abordado, evitando a bi-tributação.
Referências
[1] Sabbag E. Manual de direito tributário. 5ed. São Paulo: Editora Saraiva; 2013.
[2] Borges H.B. Planejamento tributário. 12ed. São Paulo: Editora Atlas; 2012.
[3] Borges H.B. 2011. Gerência de Impostos. 7ed. São Paulo: Editora Atlas; 2011.
[4] Rodrigues A.O; Proença A.E.; Busch C.M.; Garcia E.R.; Toda W.H. Aspectos jurídicos do Planejamento Tributário. 1ed. São Paulo: IOB; 2012.
[5] Brasil. Presidência da República. Lei n. 116, de 31 de julho de 2003. Dispõe sobre o Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência dos Municípios e do Distrito Federal, e dá outras providências. Brasília, DF; 2003.
[6] Torres R. Planejamento tributário. 2ed. Rio de Janeiro: Editora Elsevier; 2013.
[7] Brasil. Presidência da República. Lei n. 5172, de 25 de outubro de 1966. Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e institui normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios. Brasília, DF; 1966.
[8] Brasil. Presidência da República. Lei n. 5194, de 24 de dezembro de 1966. DF, Senado Federal. Regula o exercício das profissões de Engenheiro, Arquiteto e Engenheiro-Agrônomo, e dá outras providências. Brasília, DF; 1966.
[9] Brasil. Presidência da República. Emenda constitucional nº 3, de 17 de março de 1993. Brasília, DF; 1993
[10] Brasil. Presidência da República. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF; 1988.
[11] Brasil. Supremo Tribunal Federal (STF). Tema 247 – Incidência do ISS sobre materiais empregados na construção civil. 2020. Disponível em: <https://portal.stf.jus.br/jurisprudenciaRepercussao/verAndamentoProcesso.asp?incidente=3771005&numeroProcesso=603497&classeProcesso=RE&numeroTema=247>.
[12] Machado, H.B. Introdução ao planejamento tributário. Vol. II. 2ed. São Paulo: Malheiros Editores; 2014.
Como citar
Queiroz M.R.; Formaio L.C. Limites jurídicos na elaboração de um planejamento tributário empresarial. Revista E&S. 2023; 4: e20230006.
Sobre os autores
Marcela Robles Queiroz, Graduada em Ciências Contábeis, Especialista em Gestão Tributária, Diadema, SP, Brasil.
Leonardo Cosme Formaio, Mestre em Direito Negocial, Especialista em Direito Empresarial, Londrina, PR, Brasil.
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