Correlação entre estilo de negociação e perfil comportamental em profissionais de vendas
16 de dezembro de 2022
8 min de leitura
DOI: 10.22167/2675-6528-20220036
E&S 2022,3: e20220036
Bruno Bougleux Ribeiro e Paulo Mantelatto Pecorari
Ainda que não se tenha total consciência disso, a negociação está presente na rotina da maioria das pessoas. Um ótimo exemplo que mostra que a negociação marca presença desde cedo é quando bebês negociam com a mãe para conseguir alimento ou por qualquer outra demanda imediata. Mesmo que se desconheça o desejo específico, troca-se o choro por leite materno, tendo ambos – mãe e bebê – chegado ao sossego, um denominador comum[1].
No mundo da negociação existem diferentes estilos de negociadores. Uma ideia generalista é a de que os negociadores possuem um estilo primário e pelo menos um secundário, tendo a análise do estilo do oponente como fator fundamental para planejar os passos a serem seguidos na negociação. Uma ótima ferramenta para evitar ou analisar e solucionar conflitos, é a compreensão desses diferentes estilos de negociadores[1], de modo a compreender suas forças e fraquezas, otimizando o entendimento da outra parte envolvida na negociação.
O conhecimento sobre o estilo de negociação, bem como sua utilização por parte do indivíduo, é de suma importância, uma vez que reconhecer o estilo do outro possibilita antecipar movimentos[2]. Desse modo, o espaço entre o sucesso e o fracasso pode ser definido pela capacidade dos negociadores[3], pois as habilidades de negociação são cada vez mais fundamentais para a vitória competitiva de uma empresa, dada a grande concorrência do mercado.
Na década de 1920, o psicólogo William Moulton Marston[4] pesquisou sobre o perfil comportamental normal das pessoas, ou seja, debruçou-se sobre as emoções cotidianas, sem levar em conta distúrbios mentais. Suas pesquisas se basearam no conhecimento de biofísica e em instrumentos estatísticos, resultando no método de avaliação comportamental, o Modelo DISC, partindo da análise de quatro configurações comportamentais: Dominância, Influência, Estabilidade e Conformidade. Essa metodologia, posteriormente relatada expansivamente na obra “As emoções das pessoas normais”, mede as predileções do indivíduo observando sua ação em determinada situação, sendo de grande utilidade para empresas, principalmente na gestão de pessoas, seja no recrutamento de ou no remanejamento de funcionários com determinado perfil para função ou time específicos[5].
A variedade de comportamentos tem causado inquietude desde a antiguidade, o que demandou o direcionamento de grande esforço a pesquisas sobre o tema, resultando em maior compreensão sobre a associação entre o traço comportamental do indivíduo e a forma com que atuará profissionalmente.
Este artigo foi desenvolvido a partir de pesquisas com profissionais da área de vendas de diversos setores, uma vez que, apesar da grande utilização da metodologia DISC por empresas, o estilo de negociação desses profissionais é pouco explorado, assim como uma possível correlação entre tal estilo e a metodologia. Tanto a área comercial quanto a de recursos humanos podem se beneficiar deste estudo caso necessitem de determinado estilo de negociador e/ou perfil comportamental específico para seu mercado de atuação, diretriz corporativa, método de atendimento ou tipo de cliente.
Marston[4] caracterizou os comportamentos típicos dos seres humanos em diversos graus, definindo quatro quadrantes entre os comportamentos, que são as emoções primárias. Trata-se de uma série de emoções, definidas como conformidade, dominância, indução e submissão, em que as relações de aliança ou conflito do ego motor alcançam seu pico, podendo manter sua direção ou alterá-la para o sentido oposto. A relação entre estímulos motores e emoções primárias é resumida pelo círculo das emoções (Figura 1).
Figura 1. Círculo das emoções
Fonte: Elaborado pelo autor com base em Marston[4]
Tendo essa definição em vista, a metodologia DISC foi criada a partir de pesquisas que visavam compreender como o ambiente impacta nas decisões dos indivíduos. Os perfis comportamentais têm suas particularidades e são definidos da seguinte maneira[4]:
- Dominância (D): caracterizada, principalmente, pela vitória sobre um oponente com intensidade inferior à do ego motor, que predomina sobre seu antagonista. Exerce controle sobre a direção final do organismo. Em suma, a dominância representa o elemento emocional mais importante, influenciando o comportamento do indivíduo desde a infância até a morte. Como características gerais do perfil dominante, pode-se citar: tende a ser direto, impositivo e controlador, sua motivação tem inclinação para o poder, busca ser o melhor e alcançar resultados;
- Influência (I): caracterizada pelo reforço do ego motor, facilitando a ação por via de influência. O perfil influente tende a confiar nos demais, ser entusiasmado e confiante, sua motivação é ser visto como divertido e popular, ser aceito e ter conexão emocional. No entanto, pode ser exagerado e desorganizado;
- Estabilidade (S): caracterizada, principalmente, pela diminuição da força do ego motor, equilibrando a força superior oposta. Como características gerais, esse perfil não sabe dizer não, pode ser inexpressivo, evita o confronto e é detalhista, sua motivação é conseguir aprovação, evitar conflitos e buscar estabilidade;
- Conformidade (C): caracterizada pela força que se adapta às forças antagônicas mais fortes, diminuindo seu próprio poder para se adequar. Como características gerais é dedicado, detalhista, confiável e não delega, sua motivação tem inclinação para sua independência e privacidade, informações e procedimentos, desafios mentais, ter a razão, além de receber reconhecimento e aprovação.
O ego motor é refletido nas atitudes e comportamentos dos indivíduos, sendo espelhado e podendo ser identificado[4]. O teste para identificação do perfil é fundamentado nesses fatores psicológicos que auxiliam a avaliação do lado comportamental, baseando-se em padrões que predominam em determinado ambiente. Dessa maneira diversas perguntas direcionadas são realizadas, contrapondo-se características de cada perfil, de modo que o respondente escolha a característica com a qual mais se identifica ou que melhor representa sua realidade. Assim, é possível identificar o perfil dominante de cada indivíduo. Esse perfil, por sua vez, traduz uma análise aprofundada sobre o indivíduo que serve para diversos fins.
Como já destacado, cada pessoa tem um estilo próprio de negociação, e suas características e habilidades comportamentais são desenvolvidas e ressaltadas no decorrer da execução dessas negociações[3]. Com o conhecimento do próprio estilo e o da outra parte negociante, a chance de êxito certamente é maior. Junqueira[3] faz algumas considerações sobre o estilo de negociação: é imutável, porém é possível escondê-lo, mas não indefinidamente; há sempre um estilo predominante, apesar de todos os indivíduos terem características de todos eles; é fundamental que o indivíduo enfatize as forças de seu estilo e administre as fraquezas em uma negociação; não menos importante, pode-se reconhecer o estilo de negociação da outra parte, de modo a identificar suas forças para se preparar e suas fraquezas para explorá-las.
Na teoria de Junqueira[3], quatro estilos de negociação foram identificados: catalisador, apoiador, controlador e analítico, cujas características são apresentadas a seguir:
- Catalisador: é visto pelo empreendedorismo, entusiasmo e persuasão. Orientado por ideias, utiliza sua habilidade social para persuadir e valoriza reconhecimento próprio. Em contrapartida, pode ser superficial, exclusivista, impulsivo e inconstante. Além disso, tem dificuldade de acreditar em algo, é pouco moderado e indisciplinado. Para negociar com um catalisador, é indicado explorar agilidade, facilidade, exclusividade, inovação e ambição, sem necessidade de muitos detalhes. Não é indicado enfatizar seus pontos fracos, traçando metas irrealistas e entrar no detalhe do problema;
- Apoiador: visto pelo tom amigável, é compreensivo, bom ouvinte e prestativo. Orientado pelo relacionamento, faz amizades, busca harmonia, trabalha para o grupo e valoriza a atenção que recebe, bem como ser aceito pelas pessoas. Em contrapartida, pode ser dissimulado, evita conflito, perde tempo, é influenciável e, por vezes, ineficiente. Para negociar com um apoiador, é indicado eliminar conflitos, aumentar a competência interpessoal, dar assistência e apoio, buscando trabalho em grupo e o bem-estar coletivo. Não é indicado enfatizar seus pontos fracos, tais como sua dificuldade em dizer não e sua desorganização. Deve-se concentrar na escuta ativa, pois há dificuldade de entendimento desse perfil;
- Controlador: geralmente visto pelo poder de decisão, eficiência, agilidade e objetividade. Assume riscos e é orientado por resultados. Confia na eficiência com trabalhos entregues no prazo estipulado, valoriza resultados e cumprimento de metas. Em contrapartida, é crítico, impaciente, insensível e autoritário, precisando ser mais humilde e escutar mais. Para negociar com um controlador, é indicado explorar o ganho de tempo e dinheiro, o atingimento de metas e resultados, bem como cumprimento da função, de modo simples e racional. Não é indicado enfatizar seus pontos fracos, tais como: o egoísmo, o domínio, o fato de não se importar com as pessoas e a falta de habilidade para trabalho em equipe;
- Analítico: visto pela seriedade, organização, paciência, equilíbrio e cuidado. Tem credibilidade, é orientado pelos procedimentos e valoriza segurança e garantias. Em contrapartida, é indeciso, meticuloso, teimoso, perfeccionista e procrastinador. Para negociar com um analítico, é indicado explorar dados, pois busca tomar decisões seguras, alternativas para análise, organização e sistematização, diminuindo risco e aumentando a segurança. Não é indicado enfatizar seus pontos fracos, tais quais grande atenção aos detalhes, teimosia e indecisão.
Para identificação do estilo de negociação são utilizadas palavras voltadas para as características do comportamento dominante, seja ele condescendente, informal ou formal, utilizando matriz específica para formatar o resultado do teste, apresentando, finalmente, o estilo de negociador do participante. O instrumento de coleta de dados foi um questionário eletrônico, composto por 65 questões fechadas (5 questões sociais, 20 do teste de estilo de negociação e 40 do teste de perfil comportamental DISC), aplicado em empresas nacionais de diversos setores.
Dos 250 profissionais de vendas convidados a participarem da pesquisa, obteve-se respostas de 33,2% deles, representando 83 respondentes. Na caracterização dos indivíduos, especificamente no que tange ao perfil comportamental, apenas um dos respondentes apresentou resultado inconclusivo, demonstrando características híbridas dos quatro perfis, o que é extremamente raro, sendo, portanto, desconsiderado dos resultados. É necessário esclarecer, no entanto, que tanto no estilo de negociação quanto no perfil comportamental é possível haver perfis híbridos com características de até dois estilos. Sendo assim, existe a possibilidade de os números e porcentagens excederem o número total de respondentes. Dos 85 perfis comportamentais analisados, identificou-se que em 55% predomina perfil Dominante, enquanto 22% representam o perfil predominantemente Influente, 16% pertencem ao perfil Conforme e apenas 6% representam o perfil Estável.
Considerando que no estilo de negociação apresentado por Junqueira[3] perfis híbridos são mais comuns, o número de perfis identificados foi maior que o número de respondentes, sendo contabilizados 106 perfis na totalidade. Identificou-se o estilo analítico como preponderante, representando 66% dos estilos; na sequência, o estilo apoiador apareceu em 22% dos respondentes; o estilo controlador foi identificado em 19%; o estilo catalisador em 13%; e, por fim, em 5% dos respondentes foi identificado o estilo equilibrado, o mais raro. Assim como no perfil comportamental, o número excedente reflete os perfis híbridos.
Ao analisar a correlação entre os estilos e perfis comportamentais, percebe-se uma relação significativa entre o perfil dominante e o estilo analítico, uma vez que o estilo analítico aparece com perfil Dominante em 72% dos respondentes, enquanto a Dominância aparece nos demais estilos de negociação com porcentagens bastante inferiores, a saber: 19% no estilo Controlador, 15% no estilo Apoiador, 12% no estilo Catalisador e apenas 0,2% no estilo Equilibrado. Na Figura 2, pode-se visualizar a participação de cada estilo de negociação por perfil comportamental.
Figura 2. Participação de cada estilo de negociação por perfil comportamental
Fonte: Elaborado pelo autor
Além do perfil comportamental e do estilo de negociação, buscou-se conhecer melhor os respondentes, a fim de identificar alguma relação entre o perfil dominante e aspectos como faixa etária, escolaridade, segmento de mercado, tipo de negócio em que atua e/ou tipo de vendedor. Foi possível observar que o perfil dominante se sobrepõe em quase todas as segmentações citadas, contando apenas com três exceções: na faixa etária, em participantes com mais de 56 anos predominam os perfis Dominância e Influência, com 40% dos respondentes em cada; no setor de tecnologia, o perfil Dominante divide a maior parcela com o perfil Influente, representando 40% cada; os profissionais do setor logístico, por sua vez, apresentam maior perfil Influente, com 43%, seguido do Dominante, com 36%.
Ao analisar, em toda a amostra, apenas a combinação entre o perfil Dominante e estilo de negociação analítico por indivíduo, essa combinação representa 41,5%, entre as vinte combinações possíveis.
Essa constatação pode fortalecer a ideia de que a atuação na área comercial exige controle sobre o processo, vitória e predominância sobre os concorrentes, de modo a manter o alto nível de competitividade, assim como descrito no perfil de Dominância. Além disso, é importante que se tenha a flexibilidade do estilo analítico, sendo um profissional com grande credibilidade, seriedade e máxima organização.
Dessa forma, conclui-se que a correlação entre o perfil dominante e o estilo de negociação analítico foi identificada em 41,5% dos respondentes. Ademais, determinou-se o perfil dominante como principal perfil na maioria dos segmentos previstos e analisados neste estudo, excetuando-se, conforme apontado anteriormente, profissionais maiores de 56 anos, bem como os setores de tecnologia e logístico, nos quais o perfil predominante foi o de Influência.
Referências
[1] Martinelli D.P.; Almeida A.P. Negociação: como transformar confronto em cooperação. 1ed. 1997. Atlas, São Paulo, SP, Brasil.
[2] Martinelli D.P.; Almeida A.P. Negociação e solução de conflitos: do impasse ao ganha-ganha através do melhor estilo. 2009. Atlas, São Paulo, SP, Brasil
[3] Junqueira L.A.C. Negociação: tecnologia e comportamento. 11ed. 1995. COP Editora, Rio de Janeiro, RJ, Brasil.
[4] Marston W.M. As emoções das pessoas normais. 2020. Editora Success For You, São Paulo, SP, Brasil.
[5] Bonnsterrer B.J; Ribas A. Manual Definitivo DISC. 2016. Editora Success For You, São Paulo, SP, Brasil.
Como citar
Ribeiro B.B.; Pecorari P.M. Correlação entre estilo de negociação e perfil comportamental em profissionais de vendas. Revista E&S. 2022; 3: e20220036.
Sobre os autores
Bruno Bougleux Ribeiro, Executivo Técnico-Comercial, Especialista em Gestão de Vendas, São Paulo, SP, Brasil.
Paulo Mantelatto Pecorari, Professor Doutor em Engenharia de Produção, Especialista em Gestão Empresarial, Piracicaba, SP, Brasil.
Link para download: https://revistaes.com.br/wp-content/uploads/2022/12/ES_36.pdf